Sindicato Patronal de Condomínios Residenciais, Comerciais, Mistos e Empresas de Administração de Condomínios no Estado do Espírito Santo

06/20/2024 | Press release | Distributed by Public on 06/20/2024 08:14

A floresta e os edifícios

Enquanto o país se prepara para sediar, em novembro de 2025, a 30 a Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), em Belém, fica cada vez mais claro que a promoção da construção sustentável precisa fazer parte da estratégia de enfrentamento da crise provocada pelo aquecimento global.

O Brasil, que acolhe o evento internacional em plena Amazônia, com sua floresta a ser preservada, tem uma posição de destaque no desenvolvimento de uma economia global de baixo carbono, seja pela sua matriz energética limpa, pelo avanço notável no campo dos biocombustíveis e pelo potencial de biodiversidade. O país tem uma grande oportunidade de ocupar a vanguarda das transformações que devem ocorrer em vários setores, como resposta às mudanças climáticas. No entanto, é preciso mais atenção à dimensão urbana dessas transformações, e a disseminação dos edifícios verdes mostra potencial para reduzir o déficit habitacional, gerar renda e reduzir o volume de emissões de gases de efeito estufa.

O setor de construção é crucial para o enfrentamento da crise climática. Somadas, a cadeia de valor da construção e operação dos edifícios e aquela da produção de materiais, como cimento e aço, representam cerca de 40% das emissões mundiais de carbono dos setores industriais e energéticos. Aproximadamente dois terços dessas emissões vêm de mercados emergentes, segundo o estudo "Edifícios Verdes: Construção Sustentável em Mercados Emergentes", publicado, em outubro de 2023, pela International Finance Corporation (IFC), que integrao Grupo Banco Mundial.

As cidades estão expostas aos riscos de eventos climáticos extremos, a exemplo do que, infelizmente, presenciamos no Rio Grande do Sul. São, assim, o lugar onde soluções de mitigação e adaptação ao clima devem ser aplicadas em larga escala para reduzir esses riscos. Existem novas tecnologias que usam a própria natureza para soluções de saneamento, drenagem e amenização do clima. Muitas dessas tecnologias vão transformar também a construção civil, um setor crítico para a qualidade de vida e a geração de empregos.

Construir de maneira sustentável é um caminho que vem sendo trilhado ainda de maneira tímida no Brasil, mas com imenso potencial de crescimento. A certificação de edifícios verdes tem se mostrado vantajosa para todos os atores, incluindo a administração pública, construtoras, incorporadoras e proprietários. Estudos feitos pela IFC em 2019 apontam que os imóveis certificados tendem a se valorizar em torno de 8% em relação aos não certificados, além de permitir redução no consumo de água e energia. As cidades, por sua vez, podem criar distritos de baixa emissão de carbono, a fim de dinamizar o desenvolvimento urbano, promover a criação de novos empregos verdes e estabelecer um novo modelo construtivo.

Os métodos de mensuração e certificação da redução do carbono incorporado nos materiais - que podem impactar nas contas futuras de água e luz dessas edificações - são bem estabelecidos e estão disponíveis no Brasil. É o caso das certificações internacionais EDGE, da própria IFC; LEED, da Global Business Certification Inc.; e AQUA-HQE™, aplicada no Brasil pela Fundação Carlos Alberto Vanzolini. Entretanto, ainda é relativamente baixo o número de certificações quando se observa o tamanho e potencial do mercado brasileiro.

Em primeiro lugar, é preciso aumentar o número de construções com certificações verdes. Engana-se quem pensa que só edifícios de escritórios corporativos podem ser certificados. Além de muitos prédios residenciais certificados e em processo de certificação, há um grande potencial para a certificação de lojas, escolas, casas, terminais rodoviários, aeroportos, galpões, parques logísticos e industriais. A disseminação dos certificados verdes para os mais variados setores é essencial para garantir o engajamento da indústria da construção na agenda de sustentabilidade do Brasil.

Um exemplo dessa versatilidade da certificação verde está na Bahia. Em Salvador, há edifícios do setor de home center certificados, como duas lojas da Ferreira da Costa, líder do segmento no Nordeste. Uma Leroy Merlin, o Novo Terminal Rodoviário e o Parque Logístico Aratu Log, na região metropolitana de Salvador, são outros edifícios que conquistaram certificações de edifícios verdes. Ao contrário de outros setores, em que o Brasil ainda não domina uma tecnologia ou parte da cadeia, o setor da construção tem plenas capacidades de implementar em larga escala soluções já conhecidas e com plena eficácia, elevando o potencial de desenvolvimento do setor e colocando-se como liderança e exemplo para o mundo.

Os governos e a academia também desempenham um papel importante. Políticas públicas, como a do IPTU verde, créditos verdes, outorga onerosa ou fasttrack para edificações sustentáveis são incentivos encontrados em cidades como Salvador (BA) e BeloHorizonte (MG) e que devem ser adotados em todo o país. Em outra vertente, as universidades assumem papel relevante na formação dos profissionais de engenharia e arquitetura responsáveis pela concepção e a execução dos futuros empreendimentos sustentáveis. É fundamental incentivar e ampliar o acesso aos edifícios verdes, qualquer que seja a certificação.

A partir daí, o foco deve ser acelerar esse processo, atraindo capital a essa nova classe de ativos e construindo carteiras de construções verdes no setor financeiro. Estudo publicado pela GIZ - agência de cooperação de apoio ao desenvolvimento sustentável da Alemanha-, em parceria com a Febraban e outras entidades, já mostrava, em 2020, grande potencial para títulos verdes no mercado brasileiro. Bancos de desenvolvimento - como a própria IFC, a Caixa e o BNDES - têm um papel crucial, apoiando construtoras, incorporadoras, bancos e gestoras de ativos imobiliários para fortalecer as carteiras imobiliárias de edifícios sustentáveis. A atuação desses agentes vai desde a assessoria técnica para o desenvolvimento de linhas de crédito verdes, bem como a capacitação dos setores da construção e imobiliário em construções sustentáveis.

Ao lado das florestas, as cidades se tornam cada vez mais um cenário de enfrentamento da crise climática. O caminho está dado e as soluções já estão disponíveis. Resta avançar.

Autores:
Carlos Leiria Pinto é gerente-geral da International Finance Corporation (IFC) no Brasil.

DiepNguyen-vanHoutte é gerente sênior doDepartamento de Negócios Climáticos da IFC.

Fonte: Valor Econômico